1ª aula da apostila entregue aos
professores no curso “Programa de
Formação Continuada Personalizado para Docentes” por Andréa Rosa. Veja mais no site em PROJETOS.
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Adolescência – um substantivo feminino, que segundo o dicionário Aurélio é o período que vai dos doze aos vinte anos de idade. Numa linguagem mais informal e cômica, a tradução que se dá para o adolescente é ”toda criatura que tem fogos de artifício dentro dela”. Nas línguas neolatinas – adolescere – significa crescer num breve espaço de tempo entre a infância e a idade adulta. A medida em que a Psicologia evoluiu e estudou especificamente essa fase, percebeu-se que ela estende-se ao longo dos anos até englobar grande parte da fase da juventude.
Freud descreveu essa fase em
seu livro “Três ensaios sobre a sexualidade” onde, pela primeira vez na
Psicanálise, foram relatados sintomas e comportamentos de uma fase diferente da
infância, na qual reflete um período de incertezas e profundas transformações
tanto fisiológicas, quanto psicológicas. A exemplo, as alterações dos
instintos, a organização do “eu” (onde a imagem corporal é o núcleo), os papéis
sociais e um re-equilíbrio hormonal e familiar para atingir a independência na
fase adulta.
Nessa fase ocorrem pelo
menos três fenômenos importantes no desenvolvimento humano: a puberdade com o
amadurecimento sexual e reprodutor (olhar biológico); a passagem da infância
para a vida adulta com a assunção de papéis adultos e a autonomia dos pais
(olhar social) e a estruturação de uma identidade definitiva para a
subjetividade (olhar psicológico).
Alguns comportamentos individuais são claramente percebidos:
inquietude física, menor capacidade de concentração, crescente ambivalência
frente as conquistas amorosas, tiques, rituais, manias de colecionar (em alguns
casos até pessoas), regressos a crenças e conceitos que anteriormente faziam
sentido, avaliação pré-genital do sexo oposto e o evitar contato com os pais.
Comportamentos grupais também são percebidos: conflito entre
a lealdade aos pais e ao grupo que pertence, desafios as normas da linguagem
coletiva(por mais que algumas sejam completamente diferentes da língua materna),
mudança de hábitos de higiene e saúde, gosto apurados em “correr riscos”, o
evitar contato com os professores ou pessoas que denotem “a supremacia do
poder” (isso inclui um desprezo pela pessoa representante), busca de segurança
somente em grupo, ver o sexo oposto como troféu, evitar toda e qualquer ajuda
do adulto (incluindo as correções verbais que lhe são feitas), geralmente se
sentem esquecidos e não queridos pelos adultos.
Helene Deutsch ressalta que
na atualidade o adolescente não mais possui um conceito de identidade e
maturidade adulta, isso se torna obscurecido uma vez que os próprios pais
frequentemente estão envolvidos com sua própria adolescência incompleta.
O mundo contemporâneo e a adolescência.
Rafael dos Santos faz uma importante observação
sobre a relação entre a adolescência e a mídia contemporânea “quando ligamos a
televisão, e os nossos queridos estudantes também, assistimos a programas que
disseminam uma juventude estereotipada por adolescentes bronzeados que malham
em academias que mais parecem uma ilha da fantasia”.
Vivemos num mundo de
aceleradíssima circulação de informações e de ideias, onde o discurso da
ciência ocupa um lugar excepcional, mas onde nenhum discurso ou representante
possui legitimidade social a ponto de ocupar o lugar de um ideal cultural
razoavelmente estável e transmissível. O que ocorre no mundo contemporâneo,
como constata Dufour é que estamos diante de figuras de Outro que não cessam de
mudar, de modo que o espaço simbólico tornou-se movediço. Desta forma, Dufour
chama a atenção para o impasse que se coloca aos adolescentes no mundo
contemporâneo "cada um está em busca de um ‘Outro’ a quem dedicar sua
vida", ou ainda, de um ideal que sirva de referência para o seu desejo.
Nos dias de hoje, é comum
vermos que os pais têm dúvidas ou realmente nem sabem em qual série o filho ou
a filha está cursando. Também é comum percebermos que os filhos desconhecem a
história de vida dos pais, suas tradições e concepções familiares, suas
origens... Dessa forma são geradas mais dificuldades para construir junto sua
história. Não há mais almoço em família, muito menos aos domingos. A
comunicação interna de uma casa tem acontecido através de bilhetes, emails e
MSN. Por isso nossos jovens estão recorrendo aos meios externos como fontes de
informação, esclarecimentos e escuta.
Há sites, revistas com
informações sobre tudo, os quais tiram qualquer dúvida sobre muitos e inúmeros
assuntos, incluindo dietas (para terem um corpo perfeito, recorrendo às
cirurgias plásticas), dando dicas e “conselhos”. Esses mecanismos estão sendo
utilizados em lugar de diálogos em família, e isso tem gerado perdas
importantes na construção do sujeito – adolescente, enquanto pessoa.
Relação professor – adolescente e a aprendizagem.
Muitos pais e mestres, de
uma geração chamada X (pessoas que nasceram entre 1965 a 1977 que possuem
entre 32 a
44 anos) aprenderam de outra forma; em meio ao silêncio, esforço repetitivo
(como decorar tabuada), tendo que atingir notas altas e provar que era
inteligente, lendo muito e principalmente repensando várias vezes antes de
responder. Fazendo as famosas revisões. Se
deparam com seu filho e aluno agindo de forma bastante diferente do que
vivenciaram em sua adolescência. Uma geração impetuosa, que ouve pouco, não tem
paciência para muitas explicações e não revisa nada do que tenha feito. Se vêm perplexos perante o
quarto ou uma sala de aula, aparentemente desorganizado dos seus adolescentes:
televisão ligada, computador com muitas possibilidades “abertas” como chats,
blogs, Twitter, Facebook e várias páginas da net abertas, livros e cadernos
espalhados, falando ao celular, máquina fotográfica próxima para registra todos os momentos e música (podendo
estar tocando no próprio computador ou nos Ipods de última geração), de
preferência no volume abusivo e tudo funcionando simultaneamente. E “isso” constitui
o seu “espaço de trabalho”. E se perguntam como conseguem estes jovens manter a
concentração e construir momentos de aprendizagem significativa e duradoura.
Imagem extraída
do BLOG de José Paulo Santos
Diferentemente dos anos
iniciais do Ensino Fundamental, o aluno adolescente está frente às novas
exigências na escola, as quais coincidem com mudanças e reações da fase em que
está vivendo. Já sabemos que o corpo desse jovem está passando por alterações
físicas e hormonais e na maioria das vezes poderá provocar estranhamento e
sensação de desconforto. Embora cada adolescente reaja à sua maneira,
movimentos contraditórios são comuns nessa fase. Alguns querem voltar a ser
criança, enquanto outros reivindicam mais autonomia. Momentos de
grande introspecção, com ar de estar no "mundo da lua", indicam que o
jovem está tentando colocar os pensamentos em ordem e entender o que está
acontecendo com ele.
O adolescente se
vê só, nessa caminhada de construção da identidade e nem um pouco compreendido.
Apega-se rapidamente ao grupo com quem se identifica, que o acolhe
imediatamente. O grupo por sua vez, fala a mesma linguagem, possui
características similares e entende o que esse adolescente está passando. É um
grupo que recorre à mídia para tirar suas dúvidas e “matar suas curiosidades”.
Nesse sentido, a escola
possui papel fundamental na formação desse adolescente, pois provém dela o auxílio em formar concepções
de base como o trabalho coletivo, individual, a produção, negociação,
conservação e diálogo. Através da educação, a curiosidade desse jovem será
aguçada e a busca pela superação tornar-se-á inerente à faixa etária.
Tanto essa geração, quanto
as escolas, já possuem investimentos sólidos com relação aos materiais e
recursos tecnológicos. É preciso investir na inteligência científica, na
pesquisa, na investigação literária desse jovem. Fazer com que perceba que
existe muito mais construções, discussões, transformações a serem conquistadas,
além da informação que ele possui. O fóco central deve ser: o que essa geração
Y pode fazer com tanta informação, transformando-a em conhecimento.
O professor em sala de aula,
terá que, entre muitas outras atitudes, superar uma mídia interativa e desfazer
um espaço vazio que ficou para esse aluno. O qual deve ser preenchido. Além de requerer desse professor muita
serenidade.
Não existe
receita pronta das atitudes que devem ser tomadas para que esse professor tenha
sucesso no dia a dia escolar. Perrenoud diz “o ofício de educador é complexo”. Mas,
vale ressaltar que algumas posturas são fundamentais na busca desse sucesso:
Ø Construir
com embasamento teórico, a sua prática;
Ø Aprofundar
nas mais variadas teorias que explicam essa fase, com todo o contexto
psicológico, físico, emocional, linguístico, pedagógico, que lhe são
compatíveis e cabíveis;
Ø Possuir
uma prática reflexiva;
Ø Refletir
sobre suas atitudes individuais e coletivas frente ao grupo de docentes.
Mas como interagir com esse
aluno e esse grupo para que sejam reconstruídos valores esquecidos?
Para isso, temos que contar
com educadores capacitados numa Pedagogia crítica para distinguir o discurso
ideológico nas diversas narrativas dos muitos textos culturais (ou não) que
circulam nessa sociedade capitalista, que tanto encanta e convence o jovem. Dessa
forma o educador conseguirá fazer com que o adolescente veja a parte “maléfica”
de possíveis intenções coletivas e seja capaz de refletir sobre seus ideais.
O professor deverá apresentar algumas ações concretas, que atinjam de
forma positiva esse aluno no individual e coletivo:
Ø Trazer
uma reflexão profunda e saudável sobre a vida para esse jovem, dessa forma colaborará
na construção de sua identidade.
Ø Estreitar
vínculos afetivos, mas sempre com ponderação, cautela e maturidade. Uma relação
carinhosa e responsável.
Ø Criar
espaços para discussões coletivas, onde o grupo possa se perceber, enquanto
agentes de transformação.
Ø
Colocar
a responsabilidade como meta, que faz parte de uma preparação, e não como um
comportamento obrigatório.
Ajudando o adolescente.
Enquanto professor, você poderá ajudar esse adolescente a entender
melhor o mundo, descobrir o outro e “se redescobrir”.
CUIDADO!
Dicas:
Ø Conhecer bem cada adolescente, cada
aluno.
Ø Conversar sobre as mudanças que esse
aluno está sofrendo no coletivo. O que seja pertinente ao ciclo geral da
adolescência.
Ø Fazer com que ele conheça as suas
limitações e as suas possibilidades.
Ø Ajudar a esclarecer o que é a
autêntica liberdade, distinguindo-a da libertinagem.
Ø Desenvolver nele a virtude da
fortaleza, para que possa fazer por si mesmo, esforços pessoais.
Ø Fomentar a flexibilidade nas relações
sociais.
Ø Sugerir atividades que lhe permitam
estar ocupado.
Ø Refletir com esse adolescente as
influências negativas da mídia, especialmente as que derivam da manipulação
publicitária e as que motivam condutas sexuais desordenadas. Sem se mostrar
íntimo, contanto suas experiências ou sendo partidário sobre algum movimento.
Ø Guiar ações para que demonstrem condutas
nobres.
Ø Mostrar que no silêncio também
aprendemos. Descobrir que nesse momento existem possibilidades reflexivas, de
escolhas e decisões.
Ø Colaborar com eles para que descubram
o valor e o respeito pela intimidade de cada um.
Ø Mostrar que a paciência e o amor,
unidos a uma suave firmeza, são os recursos para libertar o jovem da esfera das
suas impertinências.
Ø Evitar os enfrentamentos e atitudes
violentas. Permitindo e aprendendo a se acalmar perante as suas reações.
Ø Dialogar sempre.
Ø Escutar para compreender o que o outro
diz.
Ø Refletir sobre outros pontos de vista.
Mesmo que isso signifique reconhecer que o que pensava estava errado.
Ø Saber assumir seus próprios erros,
sabendo pedir perdão e perdoar.
“A felicidade não depende do que nos falta,
mas do bom uso que fazemos do que temos”.
Thomas
Hardy
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