sábado, 18 de fevereiro de 2012

ADOLESCÊNCIA: conhecendo melhor.



1ª aula da apostila entregue aos professores no curso “Programa de Formação Continuada Personalizado para Docentes” por Andréa Rosa. Veja mais no site em PROJETOS.    
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 Adolescência – um substantivo feminino, que segundo o dicionário Aurélio é o período que vai dos doze aos vinte anos de idade. Numa linguagem mais informal e cômica, a tradução que se dá para o adolescente é ”toda criatura que tem fogos de artifício dentro dela”. Nas línguas neolatinas – adolescere – significa crescer num breve espaço de tempo entre a infância e a idade adulta. A medida em que a Psicologia evoluiu e estudou especificamente essa fase, percebeu-se que ela estende-se ao longo dos anos até englobar grande parte da fase da juventude.

Freud descreveu essa fase em seu livro “Três ensaios sobre a sexualidade” onde, pela primeira vez na Psicanálise, foram relatados sintomas e comportamentos de uma fase diferente da infância, na qual reflete um período de incertezas e profundas transformações tanto fisiológicas, quanto psicológicas. A exemplo, as alterações dos instintos, a organização do “eu” (onde a imagem corporal é o núcleo), os papéis sociais e um re-equilíbrio hormonal e familiar para atingir a independência na fase adulta.  

Nessa fase ocorrem pelo menos três fenômenos importantes no desenvolvimento humano: a puberdade com o amadurecimento sexual e reprodutor (olhar biológico); a passagem da infância para a vida adulta com a assunção de papéis adultos e a autonomia dos pais (olhar social) e a estruturação de uma identidade definitiva para a subjetividade (olhar psicológico).  

Alguns comportamentos individuais são claramente percebidos: inquietude física, menor capacidade de concentração, crescente ambivalência frente as conquistas amorosas, tiques, rituais, manias de colecionar (em alguns casos até pessoas), regressos a crenças e conceitos que anteriormente faziam sentido, avaliação pré-genital do sexo oposto e o evitar contato com os pais.

Comportamentos grupais também são percebidos: conflito entre a lealdade aos pais e ao grupo que pertence, desafios as normas da linguagem coletiva(por mais que algumas sejam completamente diferentes da língua materna), mudança de hábitos de higiene e saúde, gosto apurados em “correr riscos”, o evitar contato com os professores ou pessoas que denotem “a supremacia do poder” (isso inclui um desprezo pela pessoa representante), busca de segurança somente em grupo, ver o sexo oposto como troféu, evitar toda e qualquer ajuda do adulto (incluindo as correções verbais que lhe são feitas), geralmente se sentem esquecidos e não queridos pelos adultos. 

Helene Deutsch ressalta que na atualidade o adolescente não mais possui um conceito de identidade e maturidade adulta, isso se torna obscurecido uma vez que os próprios pais frequentemente estão envolvidos com sua própria adolescência incompleta.


O mundo contemporâneo e a adolescência.

Rafael dos Santos faz uma importante observação sobre a relação entre a adolescência e a mídia contemporânea “quando ligamos a televisão, e os nossos queridos estudantes também, assistimos a programas que disseminam uma juventude estereotipada por adolescentes bronzeados que malham em academias que mais parecem uma ilha da fantasia”.  

Vivemos num mundo de aceleradíssima circulação de informações e de ideias, onde o discurso da ciência ocupa um lugar excepcional, mas onde nenhum discurso ou representante possui legitimidade social a ponto de ocupar o lugar de um ideal cultural razoavelmente estável e transmissível. O que ocorre no mundo contemporâneo, como constata Dufour é que estamos diante de figuras de Outro que não cessam de mudar, de modo que o espaço simbólico tornou-se movediço. Desta forma, Dufour chama a atenção para o impasse que se coloca aos adolescentes no mundo contemporâneo "cada um está em busca de um ‘Outro’ a quem dedicar sua vida", ou ainda, de um ideal que sirva de referência para o seu desejo.

Nos dias de hoje, é comum vermos que os pais têm dúvidas ou realmente nem sabem em qual série o filho ou a filha está cursando. Também é comum percebermos que os filhos desconhecem a história de vida dos pais, suas tradições e concepções familiares, suas origens... Dessa forma são geradas mais dificuldades para construir junto sua história. Não há mais almoço em família, muito menos aos domingos. A comunicação interna de uma casa tem acontecido através de bilhetes, emails e MSN. Por isso nossos jovens estão recorrendo aos meios externos como fontes de informação, esclarecimentos e escuta.

Há sites, revistas com informações sobre tudo, os quais tiram qualquer dúvida sobre muitos e inúmeros assuntos, incluindo dietas (para terem um corpo perfeito, recorrendo às cirurgias plásticas), dando dicas e “conselhos”. Esses mecanismos estão sendo utilizados em lugar de diálogos em família, e isso tem gerado perdas importantes na construção do sujeito – adolescente, enquanto pessoa.       

Relação professor – adolescente e a aprendizagem.

Muitos pais e mestres, de uma geração chamada X (pessoas que nasceram entre 1965 a 1977 que possuem entre 32 a 44 anos) aprenderam de outra forma; em meio ao silêncio, esforço repetitivo (como decorar tabuada), tendo que atingir notas altas e provar que era inteligente, lendo muito e principalmente repensando várias vezes antes de responder. Fazendo as famosas revisões.  Se deparam com seu filho e aluno agindo de forma bastante diferente do que vivenciaram em sua adolescência. Uma geração impetuosa, que ouve pouco, não tem paciência para muitas explicações e não revisa nada do que tenha feito. Se vêm perplexos perante o quarto ou uma sala de aula, aparentemente desorganizado dos seus adolescentes: televisão ligada, computador com muitas possibilidades “abertas” como chats, blogs, Twitter, Facebook e várias páginas da net abertas, livros e cadernos espalhados, falando ao celular, máquina fotográfica próxima para  registra todos os momentos e música (podendo estar tocando no próprio computador ou nos Ipods de última geração), de preferência no volume abusivo e tudo funcionando simultaneamente. E “isso” constitui o seu “espaço de trabalho”. E se perguntam como conseguem estes jovens manter a concentração e construir momentos de aprendizagem significativa e duradoura.
  
         
Imagem extraída do BLOG de José Paulo Santos
                  

Diferentemente dos anos iniciais do Ensino Fundamental, o aluno adolescente está frente às novas exigências na escola, as quais coincidem com mudanças e reações da fase em que está vivendo. Já sabemos que o corpo desse jovem está passando por alterações físicas e hormonais e na maioria das vezes poderá provocar estranhamento e sensação de desconforto. Embora cada adolescente reaja à sua maneira, movimentos contraditórios são comuns nessa fase. Alguns querem voltar a ser criança, enquanto outros reivindicam mais autonomia. Momentos de grande introspecção, com ar de estar no "mundo da lua", indicam que o jovem está tentando colocar os pensamentos em ordem e entender o que está acontecendo com ele.

O adolescente se vê só, nessa caminhada de construção da identidade e nem um pouco compreendido. Apega-se rapidamente ao grupo com quem se identifica, que o acolhe imediatamente. O grupo por sua vez, fala a mesma linguagem, possui características similares e entende o que esse adolescente está passando. É um grupo que recorre à mídia para tirar suas dúvidas e “matar suas curiosidades”.

Nesse sentido, a escola possui papel fundamental na formação desse adolescente, pois provém dela o auxílio em formar concepções de base como o trabalho coletivo, individual, a produção, negociação, conservação e diálogo. Através da educação, a curiosidade desse jovem será aguçada e a busca pela superação tornar-se-á inerente à faixa etária.

Tanto essa geração, quanto as escolas, já possuem investimentos sólidos com relação aos materiais e recursos tecnológicos. É preciso investir na inteligência científica, na pesquisa, na investigação literária desse jovem. Fazer com que perceba que existe muito mais construções, discussões, transformações a serem conquistadas, além da informação que ele possui. O fóco central deve ser: o que essa geração Y pode fazer com tanta informação, transformando-a em conhecimento.        

O professor em sala de aula, terá que, entre muitas outras atitudes, superar uma mídia interativa e desfazer um espaço vazio que ficou para esse aluno. O qual deve ser preenchido. Além de requerer desse professor muita serenidade.

Não existe receita pronta das atitudes que devem ser tomadas para que esse professor tenha sucesso no dia a dia escolar. Perrenoud diz “o ofício de educador é complexo”. Mas, vale ressaltar que algumas posturas são fundamentais na busca desse sucesso:

Ø  Construir com embasamento teórico, a sua prática;
Ø  Aprofundar nas mais variadas teorias que explicam essa fase, com todo o contexto psicológico, físico, emocional, linguístico, pedagógico, que lhe são compatíveis e cabíveis;
Ø  Possuir uma prática reflexiva;
Ø  Refletir sobre suas atitudes individuais e coletivas frente ao grupo de docentes.
                       

Mas como interagir com esse aluno e esse grupo para que sejam reconstruídos valores esquecidos?
                  
Para isso, temos que contar com educadores capacitados numa Pedagogia crítica para distinguir o discurso ideológico nas diversas narrativas dos muitos textos culturais (ou não) que circulam nessa sociedade capitalista, que tanto encanta e convence o jovem. Dessa forma o educador conseguirá fazer com que o adolescente veja a parte “maléfica” de possíveis intenções coletivas e seja capaz de refletir sobre seus ideais.
                  

O professor deverá apresentar algumas ações concretas, que atinjam de forma positiva esse aluno no individual e coletivo:
                  
Ø  Trazer uma reflexão profunda e saudável sobre a vida para esse jovem, dessa forma colaborará na construção de sua identidade.
Ø  Estreitar vínculos afetivos, mas sempre com ponderação, cautela e maturidade. Uma relação carinhosa e responsável.
Ø  Criar espaços para discussões coletivas, onde o grupo possa se perceber, enquanto agentes de transformação.  
Ø  Colocar a responsabilidade como meta, que faz parte de uma preparação, e não como um comportamento obrigatório.
    
Ajudando o adolescente.


Enquanto professor, você poderá ajudar esse adolescente a entender melhor o mundo, descobrir o outro e “se redescobrir”.

CUIDADO!



Dicas:

Ø  Conhecer bem cada adolescente, cada aluno.
Ø  Conversar sobre as mudanças que esse aluno está sofrendo no coletivo. O que seja pertinente ao ciclo geral da adolescência.
Ø  Fazer com que ele conheça as suas limitações e as suas possibilidades.
Ø  Ajudar a esclarecer o que é a autêntica liberdade, distinguindo-a da libertinagem.
Ø  Desenvolver nele a virtude da fortaleza, para que possa fazer por si mesmo, esforços pessoais.
Ø  Fomentar a flexibilidade nas relações sociais.
Ø  Sugerir atividades que lhe permitam estar ocupado.
Ø  Refletir com esse adolescente as influências negativas da mídia, especialmente as que derivam da manipulação publicitária e as que motivam condutas sexuais desordenadas. Sem se mostrar íntimo, contanto suas experiências ou sendo partidário sobre algum movimento.
Ø  Guiar ações para que demonstrem condutas nobres.
Ø  Mostrar que no silêncio também aprendemos. Descobrir que nesse momento existem possibilidades reflexivas, de escolhas e decisões.
Ø  Colaborar com eles para que descubram o valor e o respeito pela intimidade de cada um.
Ø  Mostrar que a paciência e o amor, unidos a uma suave firmeza, são os recursos para libertar o jovem da esfera das suas impertinências.
Ø  Evitar os enfrentamentos e atitudes violentas. Permitindo e aprendendo a se acalmar perante as suas reações.
Ø  Dialogar sempre.
Ø  Escutar para compreender o que o outro diz.
Ø  Refletir sobre outros pontos de vista. Mesmo que isso signifique reconhecer que o que pensava estava errado.
Ø  Saber assumir seus próprios erros, sabendo pedir perdão e perdoar.  

A felicidade não depende do que nos falta, mas do bom uso que fazemos do que temos”.
Thomas Hardy


REFERÊNCIAS

Ø  BLOS, P. Adolescência. Uma interpretação psicanalítica. São Paulo. Martins Fontes, 1994. 
Ø  DELUZ, Ariane; GIBELLO, Bernard; OCTAVE, Jean Hebrard. A crise de adolescência.  Companhia De Freud. 1999.  
Ø  DEUTSCH, Helene. Problemas psicológicos da adolescência com ênfase na formação de grupos. Rio de Janeiro: Zahar, 1977. 
Ø  DUFOUR, Dany-Robert. A Modernidade e a questão do Outro. O Adolescente e a Modernidade - Anais do Congresso Internacional de Psicanálise e suas Conexões, tomo III. Rio de Janeiro, Escola Lacaniana de Psicanálise, 2000.
Ø  FERREIRA SALLES, Leila Maria. Adolescência, escola e cotidiano; contradições entre o genérico e o particular. Piracicaba: UNIMEP, 1998.
Ø  FREUD, Sigmund. Três ensaios sobre a Teoria da Sexualidade. Rio de Janeiro, Imago, 1972. v.7.
________(1914). Algumas Reflexões sobre a Psicologia do escolar. ESB, volume XIII, Rio de Janeiro, Imago, 1974.
________(1921). Psicologia de grupo e análise do ego. ESB, volume XIII, Rio de Janeiro, Imago, 1976.
Ø  MIRANDA, Margarete Pereira. Adolescência na escola: soltar a corda e segurar a ponta. Formato Editorial: Belo Horizonte, 2001.
Ø  MUSS, Rolf. Teorias da adolescência. Belo Horizonte, Interlivros. 1976.
Ø  OLIVEIRA, Sidnei. Geração Y, Era das conexões – Tempo de relacionamentos. São Paulo. Editora Clube de Autores. 2009. 
Ø  OSÓRIO, Luiz Carlos. Adolescente hoje. Porto Alegre: Artmed, 1992.
Ø  PERRENOUD, Philippe. A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização e razão pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2002.            
Ø  SACRISTÁN, José Gimeno. O aluno como invenção. Porto Alegre: Artmed, 2005.
Ø  SANTOS, Rafael dos. Mas que história é essa? In: Trindade, Azoilda Loretto e Rafael dos Santos(orgs.) Multiculturalismo-mil e uma face da escola. Rio de Janeiro: DP&A, 1999, PP.63-89. 
Ø  SPITZ, Christian. Adolescentes perguntam. Summus, 1997.  
Ø  TIBA, Içami. Adolescentes: Quem ama educa! Integrare Editora. 2005.
__________  Família de Alta Performance: conceitos contemporâneos na educação. Integrare Editora.

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