Publicado na revista Direcional Educador,
Jan. 2011, pág. 30 a 33.
Aprendizagem Significativa pode
ser um tema, que para muitos, já tenha se desgastado com o passar dos anos. Se
pensarmos no mesmo como um modismo ou num conceito trabalhado na década de 60,
70 por David Ausubel, com sua Teoria da Aprendizagem, com certeza será um
assunto bastante redundante e ultrapassado. Talvez se olharmos como um ponto
que virou referência nas concepções psicopedagógicas, desde que os cursos nessa
área iniciaram, também acreditaremos nisso. Numa concepção falida e cansativa,
embarcada pelo tempo e que hoje possa ser um simples ato inutilizado. Pior do
que isso, se analisarmos, friamente, o uso desse conceito em nossa prática
sistematizada, atualmente, pelos sistemas apostilados de ensino, com certeza
desistiremos do assunto e definitivamente teremos plena certeza de que é uma
teoria nostálgica.
Por outro lado, para aqueles
que realmente se preocupam em resgatar, constantemente, essa prática e torná-la
muito mais do que uma teoria, um modismo ou uma concepção ultrapassada;
torná-la um ato prático e aplicá-la nas relações interpessoais entre
professor-aluno, tenho certeza de que gostará de conversar um pouco a respeito
desse assunto, o qual não possui término e sim, reinicio a cada nova
experiência dentro da sala de aula.
Talvez alguns professores
estejam pensando: “Mas que ‘démodé’ falar sobre esse assunto”. “Já estamos
cansados de ouvir essa mesma ‘prece’ constantemente”. Realmente, concordo. Que
cansativo! Porém se essa atitude estivesse inserida e impregnada nos
professores de todos os níveis, como as coordenadoras pedagógicas esperam, não
precisaríamos passar esse tempinho discutindo a respeito. Muito menos
relembrando que não é uma ação isolada, mas subjaz na construção do
conhecimento. É algo pertinente e indiscutivelmente interligado. Não deve ser
um procedimento impingido.
Damos algumas desculpas para
não aceitarmos que estamos falhando em nossos procedimentos didáticos. Alegamos
que os adolescentes “não querem saber de nada”; que estudar para eles é
obrigatório; não veem como algo fundamental, importante muito menos necessário.
Brincam o tempo todo com determinadas “frases prontas” como “quem não estuda vira
Presidente da República” ou “quem não cola não sai da escola” e vejam que essa
frase é da minha época!
Normalmente o professor
ainda insisti em arrumar pretextos para não assumir que está difícil lidar com
essa tal “aprendizagem significativa”. Coloca que a culpa possa ser dos alunos
ou que o motivo de seu desinteresse pelo assunto fica expresso em outras frases
como “o tempo é curto para elaborarmos novos procedimentos eficazes para atingirmos
nossos alunos”, no bom sentido. Evidentemente! “Temos muita ‘papelada’ para
preencher”. “Cada vez mais a coordenação nos sobrecarrega com documentos que
devem ser apresentados para as Diretorias de Ensino ou para a própria Direção
do colégio”, a qual exige aqueles “questionários de satisfação ou de
desempenho”. São tantas obrigações excludentes à sala de aula que “fica cada
vez mais impossível, pensarmos nos alunos”.
Mais uma vez questiono se
isso tudo não possa estar sendo uma demonstração de variadas desculpas para
ações que nem nós mesmos estamos sabendo como agir. Me preocupa bastante essa
tal “aprendizagem significativa” não ter sido aquilatada pelos verdadeiros
educadores. Fiquem tranquilos quando me incluo gratuitamente nesse “embrulho”
pois já fui professora por muitos anos e ainda sou uma coordenadora pedagógica.
Sei muito bem o que o professor e os alunos sentem. Talvez, nesse processo
todo, é que estamos tendo medo de encarar o que seja novo ou quem sabe
rearticular o “antigo”.
Você lembra mais uma questão
que eu não mencionei. Acredita que eu possa ter esquecido. Parece que todos os
autores do passado como Dewey, Stenhouse, Montessori, Decroly, Cousinet, Freinet,
Neill tiveram tempo para pensar em aprendizagem significativa, pois não lidavam
diretamente com alunos em sala de aula. Muito menos com a quantidade de 40 ou
50 alunos dentro da mesma classe, convivendo nesse século, nesses anos que estamos
vivendo, com tanta tecnologia, informação e desencontros culturais. Sem
mencionarmos na desestruturação familiar, a qual “jogou” para a escola toda uma
bagagem de responsabilidades que não nos convém. Muitos professores dizem “enquanto
escola não somos ‘obrigados’ a educar e sim transmitir conhecimento”. Bem, mas
isso é uma conversa para outro momento. Então, você se pergunta como eles eram
capazes de falar veementemente sobre auto-estruturação do conhecimento? Para
eles era muito mais fácil, falar sobre algo que nem vivenciaram. Fica
confortável para eles insistir sobre essa ação.
Vou acalmá-lo um pouco sobre esses
aspectos que se confundem em sua mente e te deixam esgotado, antes mesmo de
pensar melhor a respeito. Ainda mais nesse momento de reinicio das aulas, onde
supostamente você agiu de duas formas: ou largou todos os livros, apostilas,
projetos, ideias, elaboração de aulas para trás, a fim de descansar desse
contexto educacional e nem lembrar que é professor por um bom tempo ou você
permaneceu parte de suas férias dedicando um tempo em pesquisar novas
propostas, desafiar-se em como retornar ainda melhor, atraindo a atenção desses
“rebeldes sem causa”.
Relembrando um pouco da história, veremos que
a maioria desses autores, pedagogos, vivenciaram uma educação baseada em exames
absurdos, muito mais seletivos do que os atuais, castigos físicos, punições
excessivas, sentimentos de ódio e medo dentro da educação, mesmo porque
presenciaram guerras e sofreram mutações de experiências alternativas nas bases
educacionais. É correto afirmar que na maioria desses e tantos outros autores, eles
buscaram por uma prática diferenciada das que vivenciavam. Quiseram mudar essa
história e os caminhos que estavam sendo traçados.
Gostaria de compartilhar
alguns desses exemplos. Neill iniciou sua carreira como professor ajudante na
escola rural num município da Escócia. Sim! Neill foi “auxiliar de classe”. Só
depois tornou-se professor substituto, titular e por fim diretor-interino de
uma escola em Gretna. Dewey
após formar-se em 1879 em Vermont trabalhou como professor secundário (o que
equivaleria nos dias atuais ao Ensino Fundamental) por três anos e após o
doutorado em Filosofia trabalhou como professor universitário. Stenhouse foi
docente da Educação Básica (antigo Primário, atual Ensino Fundamental) antes de
iniciar sua carreira como professor universitário.
Como podemos observar a grande
maioria desses autores, pedagogos ou mesmo que não tenham a formação inicial na
área da educação, atuaram junto aos alunos e docentes, mostrando que existem
formas de se obter aprendizagem significativa, no momento em que nos permitimos
percebê-la. Eles foram docentes como nós e se mostraram insatisfeitos com o
nível de aprendizagem de seus alunos ou a falta dessa aprendizagem. Buscaram
alternativas e soluções para possíveis “problemas de aprendizagem”. Procuraram
fazer “diferente”. Ser um diferencial.
Pensando por esse ângulo,
nós também devemos buscar o diferencial em nossas aulas. Quando nem se falava
em projetos, registros ou pesquisa de campo, Stenhouse lançou essa ideia e
afirmou que “se a educação tivesse mais
lembranças e registros históricos, alguns problemas com os quais nos deparamos
seriam muito mais bem compreendidos”.
Quando o Brasil passava por
um contexto social muito denso e crítico com o militarismo e a rigidez no
diálogo, Paulo Freire desafiou criticar a concepção educacional do país e falar
abertamente que deveríamos ter uma aprendizagem dialógica. “Ninguém ignora tudo, ninguém sabe tudo”.
Se nos apropriarmos nesse
momento desses dois exemplos, entre tantos outros que poderíamos aproveitar sobre
esses grandes pedagogos veremos que já relatavam o que estamos enfrentando. Freire
relatou sobre as mudanças sociais ocorridas no país que não foram registradas e
nem dialogadas pelos professores de História ou de Geografia. Como fazer esse
diálogo ser mais significativo para os alunos? Mais interessante. Poderiam
aproveitar para fazer com que seus alunos registrem os momentos que eles estão
vivenciando. Isso inclui até as mudanças no Enem. O que não é um fato isolado ao
mundo deles, mas concreto, real, significativo e mais ainda, co-relacionado à
eles. Pode ser que num futuro e bem próximo, visto a velocidade das informações
e mutações sociais, que o próprio Enem e tantos outros acontecimentos, se
percam pela falta de registro. Um bom reinício para as aulas dessas matérias
seria solicitar aos alunos que façam uma retrospectiva do ano passado ou do 1º
semestre sobre os acontecimentos históricos. Poderão usar as multimídias, na
verdade, infinitas mídias, para apresentarem esse trabalho. O visual é
fundamental para essa juventude. Imagine que delicia você assistir uma
“retrospectiva 1º semestre 2010” ,
apresentadas por seus alunos, contextualizando o que os afeta diretamente,
antes do final do ano.
Quer melhor momento de
resgate cheio de significados do que esse? O professor não precisará fazer a
famosa “revisão tradicional” do pós férias por duas aulas seguidas, tentando
obter atenção dos alunos, se desgastando porque os mesmos não prestam atenção e
com certeza no final do ano, todas essas informações cairão no esquecimento,
pois tudo pode ter sido aprendido e não apreendido. Isso é um claro exemplo de
aprendizagem significativa deixando de ser um modismo ou uma concepção
ultrapassada.
Você pode estar se
perguntando se eu não conheço métodos de ensino apostilados? “Dentro dos mesmos
não há tempo para revisões dessa forma”. Sinto dizer-lhe, mas se você não “parar”
algumas aulas para fazer um resgate significativo com seus alunos, eles não
conseguirão caminhar fluentemente nos novos conteúdos que estão por vir. Para
isso existe algo chamado “planejamento vivo”. Já ouviu falar? Engraçado, não é?
Mas, o verdadeiro planejamento não é aquele monte de papéis que você entrega no
início do ano para serem arquivados e muitas vezes repemte-se por anos o mesmo,
só alterando o ano legado. Segundo Danilo Gandim “o planejamento é um processo vivo e não se resume ao preenchimento de
quadros com planos que, sob o pretexto de serem flexíveis, nunca são praticados
como foram concebidos”. Você tem que se programar para as aulas de revisão,
de resgate. Pois pode ter muitos alunos naufragando bem debaixo de seus lindos
olhos.
Outro exemplo de
aprendizagem significativa que posso falar, partindo de John Dewey que sempre
apostou na libertação literária tanto que criou a “Escola laboratório” seria
relembrá-los de uma frase muito significativa pronunciada por ele “dentro do magistério, devem existir a
iniciativa, a discussão e a capacidade de decisão”. Imaginem as turmas da
Educação Infantil e séries (ou anos) iniciais do Ensino Fundamental, dando uma
volta em torno do quarteirão, para a famosa aula “conhecendo nosso bairro”.
Antes fazíamos algo tão trivial. Os alunos em fila, com as mãos sobre o ombro
do amiguinho para que nada aconteça e nenhum se perca, vendo (simplesmente) e
não olhando o lugar, a “tia” chamando a atenção dos mesmos sobre alguns
aspectos e após algum tempo retornam para a sala de aula, fazem um lindo
desenho individual do “seu bairro” e o colocam no mural da sala ou do corredor.
Pergunto: o que foi importante, significativo e marcante para esse aluno?
Como estamos vivendo nesse
século, que você tanto reclama que as coisas “mudaram para pior”, podemos
aproveitar as tecnologias que ele pode nos oferecer “de melhor”. Que tal, se encaminharmos
um recado para os pais, que seus filhos poderão trazer a máquina digital
(excepcionalmente) para a escola e registrarem, por eles mesmos o passeio. Tudo
o que se destacar aos olhinhos deles. Tirando fotos de tudo o que considerarem
importante e significativo. Depois ao retornar para o colégio utilizarão,
juntamente com a professora de informática, o laboratório de informática para
escolherem as melhores fotos. Logicamente, cada um poderá escolher uma ou duas
dentre todas que tirou para serem colocadas num mural com um título que ele
mesmo escolher para cada foto. Só então serão colocadas no mural, na ordem
física e cronológica que o passeio aconteceu. Todos contribuirão coletivamente
com a colagem, respeitando o gosto e o olhar que cada um teve sobre os mesmos
lugares. Acredito que romperemos com nossas próprias acepções sobre o bairro.
Poderia mencionar muitos outros exemplos
nas mais variadas áreas de ensino, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio.
Seria um prazer relembrá-lo de tantas possibilidades. Porém, acredito que se
você permanecer achando essa história de “aprendizagem significativa” cansativa
e redarguir a tudo que menciono, verbalizando que você não tem culpa da
desmotivação de seus alunos; será bobagem eu insistir que nossos discentes,
desse século, compondo essa realidade, estão esperando que suas aulas se tornem
mais interessantes, produtivas, questionadoras, ousadas, experienciais,
dialogadas, inovadoras dentro dos mesmos conteúdos que estão sendo dados há
anos.
Mude!Acredite! Ouse! Você
transmitirá mais significado para a existência humana de seus alunos.
“O professor tem necessidade de, ao longo de
um certo tempo, obter elementos capazes de lhe possibilitarem a revisão de
certos pressupostos com os quais trabalha para desencadear a transposição da
experiência teórica recém adquirida para a sala de aula. A distância que separa
o conhecimento teórico da aplicação prática vai sendo diminuída, preenchida por
força de ações mediadoras, fortemente imbricadas com a própria experiência
docente, com as diferentes oportunidades de aprender que o professor encontra
ao longo do exercício do magistério, sem o que não há como percorrer caminho
algum.”
(Barretto,
Pinto, Martins, 1999: 112).
Andréa Rosa
21-07-2010
Nenhum comentário:
Postar um comentário